Missionária americana denunciou as ameaças de morte em carta à
polícia
Pressionado pela repercussão do assassinato da missionária americana
Dorothy Stang, o governo federal decidiu que vai reforçar o combate à
grilagem de terra no Pará e recuperar para a União as áreas que foram
tomadas por proprietários ilegais ao longo das últimas décadas. O anúncio
do envio de uma força-tarefa para a região será feito hoje após reunião
entre oito ministros no Palácio do Planalto. O governo vai aumentar o
contingente de agentes da Polícia Federal que atuam na área, ampliar o
número de fiscais do Incra e do Ibama e colocar até mesmo o Exército para ajudar
nas ações de regularização das terras.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que o governo vai
ampliar de seis para 19 as suas bases avançadas na Amazônia. Mais 90
fiscais do Incra serão deslocados para a região nos próximos dias. A Polícia
Federal deverá atuar com sete equipes na região, cada equipe formada por um
delegado, um escrivão e dois agentes. A PF dará cobertura às ações dos
outros órgãos, que fiscalizarão o título de posse dos fazendeiros e vão
punir a exploração predatória do meio ambiente.
Marina explicou que o Exército, que já tem convênio de parceria
com o Ministério de Meio Ambiente, terá aeronaves na região. A ministra
afirmou que o governo continuará fiscalizando os madeireiros, que terão que
comprovar ser proprietários legais das terras.
A ação do governo atende a uma determinação do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Mesmo na Venezuela, Lula se mantém informado.
— Quero que o governo reaja rapidamente e com força. Não quero que
uma coisa como essa se repita — disse o presidente ao saber do assassinato
no sábado à tarde.
Ministros se reúnem com governador
Segundo auxiliares, Lula ficou muito chateado com o crime,
especialmente porque havia conhecido Dorothy Stang durante uma das
caravanas da cidadania. Foi por determinação do presidente que os ministros
Nilmário Miranda (Direitos Humanos) e Marina Silva (Meio Ambiente) foram
para a região no fim de semana.
A reunião de hoje será coordenada pelo chefe da Casa Civil, José
Dirceu, e terá a participação dos ministros Márcio Thomaz Bastos (Justiça),
Ciro Gomes (Integração Nacional), Miguel Rossetto (Desenvolvimento
Agrário), Marina Silva, Jorge Félix (Segurança Institucional), Luiz
Gushiken (Comunicação), Nilmário Miranda e José Alencar (Defesa). Às 11h,
os ministros reúnem-se com o governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), e
irão cobrar dele empenho no combate à grilagem de terra. A orientação de
Lula é para que o governo atue de forma ofensiva:
— O governo entendeu que esse tipo de assassinato não pode deter
nossa ação. O governo tem feito uma ofensiva na região e o pior que poderia
ocorrer é a gente se intimidar — afirmou um assessor do presidente.
Marina afirmou ontem que o governo não irá recuar um milímetro na
disposição de regulamentar a exploração de terra pública e que o objetivo é
fixar a presença do Estado no Pará:
— A verdade é que há uma ausência de um século do Estado na
Amazônia. O governo está fazendo um esforço jamais visto e levando, pela
primeira vez, essa discussão para dentro do Palácio do Planalto.
Uma portaria baixada pelo Incra no fim do ano passado obriga os
donos de terra a se recadastrarem. A medida gerou dura reação dos
madeireiros, que há dez dias tentaram, sem sucesso, derrubar a decisão do
governo.
— A portaria é fundamental para o trabalho de fiscalização. Graças
a ela, cerca de dez mil propriedades tiveram seus títulos suspensos. Os
ocupantes de boa-fé das terras não terão problemas, mas quem estiver ilegal
terá problemas. Ou vão para a legalidade ou para a cadeia — disse a
ministra.
Caso é destaque na imprensa internacional
O Pará é uma região que, segundo ambientalistas e ativistas de
direitos humanos, vive uma “crescente anarquia”, de acordo com o jornal
americano “Los Angeles Times”, um dos muitos órgãos de imprensa que, mundo
afora, registraram e repercutiram o assassinato da freira americana Dorothy
Stang.
A notícia da morte foi publicada na primeira página da edição de
ontem do “New York Times”. A reportagem, que mereceu página inteira na
seção internacional, observou que a freira “tinha relações tensas com a
polícia local, que via nela uma agitadora social”, detida certa vez “sob a
suspeita de incitar violência e fornecer armas a grupos camponeses”. Assim,
afirma a reportagem, ela não podia contar com a proteção da polícia. O “New
York Times” descreveu o assassinato da irmã Dorothy como um desafio às
autoridades. Também a edição internacional do “Miami Herald” publicou a
notícia em sua primeira página ontem.
O jornal britânico “The Independent” afirmou que o assassinato
“lançou luz novamente sobre o fracasso do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva para acabar com extração ilegal de madeira”. O jornal chamou Dorothy
Stang de mártir e da Amazônia afirmou que o assassinato ressalta um
problema para o governo: “Equilibrar um desejo de proteger a floresta
tropical com a pressão para abrir trechos da floresta para apoiar um
crescimento econômico forte, tal como exigido pelo Fundo Monetário
Nacional”.
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